Guia completo para bons textos dissertativos-argumentativos
- Bruna Santos
- 6 de abr.
- 18 min de leitura
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Na vida escolar e acadêmica, uma das atividades mais desafiadoras é a redação. Segundo o INEP, em 2023 dos 3,9 milhões de inscritos no ENEM apenas 12 candidatos tiraram a nota máxima e 5% tiveram seus textos zerados.
Embora existam diversos tipos e gêneros textuais, o que costuma vir à cabeça quando pensamos em redação é o texto dissertativo-argumentativo, tradicionalmente trabalhado pelas escolas e cursos preparatórios, por ser o mais cobrado em vestibulares, concursos públicos e ENEM, onde a nota da redação é crucial para o resultado final.
Com tanta pressão, não é de se admirar que a página em branco apavore tanta gente. Mas não é preciso — e nem recomendável — se desesperar. Neste artigo você encontrará um guia para sobreviver com folga a qualquer redação que aparecer.
Índice
O que é e qual é o propósito?
O texto dissertativo-argumentativo é um tipo textual cujo objetivo é explanar um tema, desenvolvê-lo, persuadir o leitor e concluir com uma proposta de intervenção, ou seja, uma possível solução ou forma de lidar com a problemática levantada.
Esse tipo textual costuma ser o preferido das grandes provas por se encaixar bem com as principais temáticas sociais. E se nesse ponto você está pensando que a ideia é simplesmente ser polêmico, se engana.
O propósito é avaliar sua capacidade de analisar assuntos relevantes da atualidade com senso crítico, construindo uma argumentação sólida, selecionando informações, distinguindo fatos e dados concretos de opiniões e pontos de vista.
Em outras palavras, os corretores irão avaliar se você sabe pensar por escrito.
Vale ressaltar que o texto dissertativo-argumentativo deve ser escrito obrigatoriamente na terceira pessoa do singular.

Em hipótese alguma entregue sua redação com frases como “eu acho…”, “penso que…”, “segundo minha experiência…”, “nós pensamos que…”, “na minha opinião…”. Esse texto pede uma linguagem impessoal, objetiva e formal para que possa ser entendida pelo maior número de leitores possível.
Como começar
É a pergunta mais recorrente em salas de aula de produção textual. E a resposta é: planejamento.
Primeiro passo: desbrave o texto
O tema é o “coração” do texto, é o assunto por trás das palavras. Em grandes provas haverão textos de apoio ou textos motivadores, em colégios e cursinhos é provável que haja uma explanação dos professores, debates prévios, páginas recomendadas do livro didático ou a possibilidade de pesquisar em casa. Seja como for, se debruce sobre o tema, tente extrair dele o máximo de conhecimento possível e jogue isso para o papel.
Nesse momento, você ainda não estará fazendo uma redação e sim um brainstorming, ou seja, apenas compilando informações que poderão ser relevantes mais tarde.
Não se preocupe com a estética ou ordem, faça da forma que funcionar melhor para você. Use todos os aliados possíveis, marca-textos, post-its, se sentir necessidade de riscar os textos motivadores ou fazer anotações em seus livros, simplesmente faça.
Passada essa etapa, tente se fazer algumas perguntas sobre o tema:
O quê?
Como?
Quando?
Onde?
Por quê?
Esses questionamentos ajudarão a desenvolver uma linha de raciocínio sobre o assunto e auxiliarão no planejamento e organização do texto.
Segundo passo: leia e interprete a proposta
O que seu professor está pedindo? O que a prova está pedindo?


Se faça as seguintes perguntas sobre a proposta:
Qual é o tema central? Quais são as palavras-chave?
Qual é o tipo de texto e qual é o gênero textual?
Qual público lerá o texto? Como isso influencia na produção?
O texto deve ser mais formal ou informal?
Qual é o tamanho mínimo e/ou máximo?
O título é obrigatório, opcional ou proibido?
Há informações que devem, obrigatoriamente, ser citadas?
Há proibições?
O texto deve ser digitado ou manuscrito? Qual a formatação exigida?
Compreenda que várias dessas respostas não estarão presentes por escrito na proposta, mas ditas verbalmente por um professor, subentendidas na estrutura do tipo textual pedido ou nas regras da prova. Por exemplo, no ENEM são requeridas entre 7 e 30 linhas na redação. Dedique atenção a esses detalhes, pois os corretores que avaliarão seu texto, esperam que você os saiba.
Terceira opção: faça um rascunho
Com todas essas informações é hora de escolher qual tese a respeito do tema você trabalhará, quais das informações levantadas são relevantes para o desenvolvimento dessa tese e que solução irá propor.
Considere quanto tempo possui. É uma atividade escolar para o fim da aula ou para a semana seguinte? É uma prova com quantas horas de duração? Administrando corretamente o tempo, é recomendável que nesse rascunho, você comece a elaborar as informações em parágrafos esboçando a estrutura do texto.
Estrutura do texto
Um texto dissertativo-argumentativo se divide em introdução, desenvolvimento e conclusão. Essa ordem precisa ser seguida para que as ideias se encadeiem de forma lógica e façam sentido. Cada uma dessas partes tem seu propósito e regras. Existem uma série de estratégias para atingir o propósito do autor da redação em cada etapa da estrutura.
Introdução
Já ouviram falar que a primeira impressão é a que fica? Pensem nos primeiros acordes da sua música favorita, no primeiro parágrafo do seu livro preferido. As primeiras palavras de um texto são responsáveis por despertar no leitor curiosidade e interesse ou o contrário.
A função da introdução no texto dissertativo-argumentativo é apresentar o tema e isso é feito através de uma tese. A tese deve contextualizar o leitor sobre o tema da redação e a ideia principal que será defendida. Seja objetivo, evite referências abstratas como “atualmente”, “cada vez mais”, “nos primórdios da humanidade” e “com o advento da internet”.
Nesse tipo de texto costuma ser pedido em média 30 linhas, logo, a introdução não deve se alongar por mais de um parágrafo, geralmente de 4 ou 5 linhas.
Existem vários tipos de introdução, escolha a que for mais conveniente para o seu texto.
Formulação de uma tese a partir de uma declaração inicial;
Introduz declarando um dado, uma citação, um fato ou notícia a partir do qual será formulado a tese. É um dos tipos mais comuns e eficazes para boas notas em grandes avaliações.
Analise o exemplo:
“O ‘ciclo do ouro’ – ocorrido no Brasil no século XVIII – acarretou o aumento do número de escravos provenientes do continente africano no país, trazidos com graves diferenças culturais entre si, sem que fossem levados em consideração os aspectos regionais e sociais de suas origens, ocasionando uma homogeneização forçada de indivíduos. Atualmente, de forma análoga à História Colonial Brasileira, ainda há uma forte tendência à padronização cultural da África, desprezando sua pluralidade e seu legado. Assim, dois grandes desafios para a valorização da herança africana no Brasil devem ser debelados: as políticas públicas ineficazes e as falhas educacionais.”
Na redação do candidato Danilo Oliveira Batista para o ENEM 2024, que recebeu nota mil, podemos ver em azul a declaração, que nesse caso é um fato histórico, e a tese a ser desenvolvida, em vermelho.
Interrogação;
Nesse tipo de introdução, o autor levanta uma ou mais questões sobre o tema e, ao longo do texto, deve apresentar as respostas. Nenhuma pergunta pode ficar sem resposta. Não costuma ser uma forma muito escolhida de começar redações, sobretudo em grandes provas. Pode despertar o interesse do leitor, mas cuidado para não escrever perguntas demais ou perguntas que fujam ao tema.
Veja um exemplo:
“Por que será que o brasileiro não consegue assumir sua identidade? Por não tê-la ou porque é impedido? Será que ainda restam forças para tal atitude?”
Exemplo;
Como o próprio nome diz, aqui você selecionará algo que exemplifique a problemática a ser trabalhada. Por exemplo, numa redação sobre feminicídio, é possível escolher um caso e citá-lo nesse momento. Sempre que possível, não se esqueça de citar também as fontes, se preocupe com que sejam confiáveis e tome cuidado para não usar exemplos pouco conhecidos que tornem difícil a identificação do leitor.
Citação;
Modelo de introdução escolhido quando se quer transmitir credibilidade ao ponto de vista pelo apoio das palavras de outrem. Provavelmente o tipo de introdução mais utilizado em grandes provas e vestibulares.
Existem dois tipos de citação, a direta e a indireta. Na direta usamos aspas e reproduzimos exatamente as palavras ditas, como em:
Segundo Nelson Mandela, “a educação é a arma mais poderosa que você pode usar para mudar o mundo.”
De forma indireta, poderia ser dito:
Nelson Mandela pensava que a arma mais poderosa do mundo era a educação.
Definição;
Se o tema da sua redação for recente ou contiver termos pouco conhecidos, começar pela definição desses conceitos pode ajudar a contextualizar o leitor. Entretanto, se esse não for o caso, o uso desse tipo de introdução não é aconselhável. Descrever algo que já de conhecimento comum tornará sua redação pedante.
Veja um exemplo no texto de Jack Kelly para a revista Forbes:
“Diretamente do mundo dos relacionamentos, o ghosting tornou-se um dos maiores problemas para quem procura emprego no mercado de trabalho atual. O termo vem da palavra ghost, que significa fantasma em inglês, e é frequentemente usado para descrever um tipo de término em que a pessoa desaparece da vida da outra sem explicações.”
Afirmação;
Uma declaração afirmativa crítica logo no começo, muitas vezes na forma de frases de impacto, como “o Brasil é o país mais transfóbico do mundo”. É uma estratégia comum para conquistar a atenção do leitor, mas que deve ser utilizada com cautela, sem exagerar no sensacionalismo.
Comparação;
Você pode comparar o tema com algo semelhante ou oposto. A estratégia aqui é expandir a visão do leitor e conduzir para o que será trabalhado no desenvolvimento. Por exemplo, se seu tema for saúde e sua intenção é propor inovações nas políticas públicas da área, pode introduzir a redação comparando a administração pública do Brasil com outros países.
Referência
A estratégia mais queridinha entre os candidatos do ENEM — e aparentemente dos corretores também, já que muitas das redações nota mil a utilizaram. Demonstra repertório cultural e deixa o autor confortável, uma vez que está escrevendo sobre uma obra que se interessa e domina. Tente escolher obras atuais e relevantes que facilitem a aproximação do leitor.
Veja o exemplo da redação de Sabrina Ayumi Alves para o ENEM 2024:
“O livro "Nós matamos o cão tinhoso" de Luís Bernardo Honwana retrata a sociedade moçambicana durante a colonização portuguesa. Na obra literária, observa-se uma dinâmica social pautada pela inferiorização dos indivíduos negros, na qual o racismo está enraizado nas interações entre as pessoas, na qualidade de vida e na autoimagem de cada ser. Assim, ao inserir a imagem criada pelo livro no contexto brasileiro de ínfima valorização da herança africana, infere-se que o passado colonial persiste nas estruturas do Brasil, se manifestando a partir do apagamento sistemático da cultura afro-brasileira. Em razão disso, deve-se discutir o papel do Estado no setor escolar e cultural diante desse contexto de silenciamento.”
Roteiro
Nesse tipo de introdução, o ator anuncia o que irá desenvolver e a forma como pretende fazer isso. É o modelo menos comum de começar redações, principalmente em textos escolares e para grandes provas.
Veja um exemplo no texto de Walter Ceneviva para a Folha de São Paulo em 1999:
“O objetivo desse comentário consiste em avaliar o projeto de lei proibindo armas de fogo encaminhado ao Congresso pelo Ministério da Justiça. Começo com a proibição genérica do artigo 1º, envolvendo todos os cidadãos, menos os servidores das Forças Armadas, dos órgãos de segurança pública ou de inteligência federal e as organizações de segurança privada. [...]”
Desenvolvimento
A maior parte da redação, geralmente, ocupa dois parágrafos, cada um com 5 ou 6 linhas. No desenvolvimento são articulados os argumentos que sustentarão a tese e encaminharão para a conclusão. É a parte mais importante do texto, onde serão explanadas as consequências da tese. É o momento do autor demonstrar conhecimento — o que influencia muito no convencimento do leitor.
Os argumentos devem seguir uma sequência lógica, sendo argumentos únicos ou um argumento dominante seguido de complementos, eles precisam se conectar e essa conexão deve ser clara e objetiva.
Nesse ponto da redação os professores começam a aumentar a ênfase para que o aluno dê a sua opinião e, dada a estrutura impessoal do texto dissertativo-argumentativo, é também nesse momento que os estudantes se sentem mais confusos.
Sim, os avaliadores querem que você dê a sua opinião, o texto é basicamente para isso. Você deve demonstrar a sua bagagem sociocultural, mas respeitando a estrutura do gênero textual, ou seja, escreva na terceira pessoa, em linguagem formal e argumente apenas aquilo que pode comprovar.
Não confunda opinião com fato. A opinião é variável de acordo com quem a emite, fatos são estáveis, únicos e possuem respaldo. Tome extremo cuidado para não generalizar nada.
Se nesta altura da leitura você ainda está confuso, provavelmente como fazer essa argumentação ainda não ficou claro. Por isso, vejamos o próximo tópico.
Estratégias argumentativas
Argumentação é um recurso linguístico utilizado quando precisamos persuadir, provar, refutar ou afirmar algo. Pode aparecer no texto ou numa explanação verbal de forma crescente (do argumento mais fraco para o mais forte), decrescente (do mais forte para o mais fraco) ou dispersa.
Costumamos relacionar argumentação com polêmica por serem assim os temas no qual a vemos atingir todo seu potencial, mas na verdade, argumentamos o tempo todo no cotidiano.
Uma boa argumentação equilibra dois aspectos: o racional, aquele que convence, comprova, justifica, relaciona e o passional que captura e seduz. O principal objetivo de um argumento é promover credibilidade àquele que argumenta.
A qualidade da argumentação depende da atenção aos seguintes aspectos:
A correta estruturação e ordenação das frases;
O uso correto dos conectores de discurso (pesquise sobre conectivos!);
O respeito pelas regras da concordância (pesquise concordância verbal e nominal!);
O uso adequado dos pronomes que evitam as repetições do nome;
A utilização de um vocabulário variado, com o uso de sinônimos, antônimos, hiperônimos e hipônimos.
Diversificar os tipos de argumento demonstra habilidade de argumentação, porém mais importante que diversidade e quantidade é a força, a fundamentação e a eficácia em persuadir o leitor.
Dito isso, vamos aos tipos de estratégias que podem te trazer não só uma boa nota na redação, mas um desempenho melhor em todas as suas conversas:
Pergunta retórica;
É uma figura de linguagem utilizada para apresentar ou enfatizar um assunto. É perguntar sem o objetivo de obter resposta, que costuma ser óbvia ou o próprio autor responde na sequência. Possui efeito impactante no discurso, concede um tom de ironia ao texto, evidencia uma opinião, estabelece um ponto de persuasão, desperta reflexão e estimula o raciocínio.
Use com moderação, você não quer que o corretor te ache muito engraçadinho num texto que pede linguagem formal, que se sinta ofendido ou ache que você está subestimando a inteligência dele.
Comparação;
Recurso argumentativo que confronta situações, fatos ou pontos de vista, dentro do mesmo tema, para que o leitor amplie seus questionamentos.
Veja o exemplo de um texto escrito para a Folha de São Paulo em 2008 sobre a lei seca.
“Numa lista de 82 países pesquisados pela International Center for Alcohol Policies, instituição com sede em Washington (EUA), a nova lei seca brasileira com limite de 2 decigramas de álcool por litro de sangue é mais rígida que 63 nações, iguala-se em rigidez a cinco e é mais tolerante que outras 13, onde o limite legal varia de zero a 1 decigrama.”
Contra-argumentação;
Estratégia de antecipar os argumentos contrários à tese e então quebrá-los com contra-argumentos que podem ser fatos, dados, exemplos, reflexões e etc. É um recurso inteligente, demonstra domínio do assunto sobre diferentes pontos de vista, senso crítico, capacidade de análise e ponderação. Também reforça no leitor a sensação de que a tese é mais razoável.
Analise o exemplo na redação da Julia Vieira para o ENEM de 2020.
“Paralelamente ao descaso das esferas governamentais nessa questão, é fundamental o debate acerca da aversão de parte dos civis ao grupo em pauta, uma vez que ambos são impasses para sua completa socialização. Esse preconceito se dá pelos errôneos ideais de felicidade disseminados na sociedade como metas universais. Entretanto, essas concepções segregam os indivíduos entre os “fortes” e os “fracos”, em que tais fracos, geralmente, integram a classe em discussão, dado que não atingem essas metas estabelecidas, como a estabilidade emocional. Por conseguinte, aqueles que não alcançam os objetivos são estigmatizados e excluídos do tecido social. Tal conjuntura segregacioniza — os que possuem algum tipo de transtorno, nesse caso — na teia social. Dessa maneira, essa problemática urge ser solucionada para que o princípio da alemã seja validado no país tupiniquim.”
Provas concretas (números);
Dados estatísticos, resultados de enquetes, valores financeiros, índices e porcentagens são informações objetivas reconhecidas como provas irrefutáveis, desde que os números correspondam à verdade, ou seja, nada de inventar ou afirmar resultados de pesquisas que não tem certeza da confiabilidade. O significado e relevância dos números para o tema precisa estar explícito no texto.
Vide exemplo no texto de Oscar Hipólito, professor titular do IFSC na USP, para a revista Veja.
“Ao comentar o sistema de cotas que pretende adotar no ensino superior brasileiro, Diogo Mainardi acerta o alvo quando diz que a desigualdade nasce no ensino básico e certamente é lá que deve ser combatida e solucionada. De fato, o Brasil é o país que apresenta a maior desigualdade social com gastos em educação pública. Segundo a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), um estudo realizado em 2005 no Brasil, Argentina, Chile, Bolívia e Colômbia mostrou que nosso país tem a pior distribuição de gastos em educação. Apenas 17% são destinados aos 20% mais pobres e 27% aos 20% mais ricos. Por outro lado, as despesas com ensino superior no Brasil são 12,3 vezes maiores do que com o ensino fundamental. Essa relação de gasto é 2,5, na média, nos países europeus; 2,5 nos Estados Unidos; 2,6 na Argentina e 1,7 na Coreia.”
Consenso;
O famoso senso comum. São verdades aceitas como universais, sem depender de grandes esforços para comprovação, como por exemplo, “alimentação saudável e lazer são vitais para a qualidade de vida humana”, “a poluição urbana é prejudicial à saúde”.
Veja o exemplo do texto de Nelson Vitiello para a revista Pais&Teens:
“O abortamento provocado, pelos riscos que traz, não é evidentemente uma opção recomendável. Casamentos por conveniência frequentemente acabam em separação e, quando não, levam a um convívio infeliz. Finalmente, num meio preconceituoso como é o nosso, ser mãe solteira adolescente é uma condição extremamente penosa. Assim, nenhuma dessas três soluções é a ideal, cada uma delas criando novos problemas.”
Autoridade;
Argumentos que se sustentam na credibilidade de uma autoridade ou instituição reconhecida como tal, portanto, são aceitas sem evidências adicionais. São frases célebres ou trechos escritos de cientistas, técnicos, artistas, filósofos, políticos e etc. Chamam a atenção do leitor, reforçam a argumentação, demonstram familiaridade com o tema e amplitude de bagagem cultural.
Muito utilizado, mas deve-se ter atenção. Se a frase for falaciosa, se a autoridade que a disse for questionável ou mesmo não bem aceita pelo público geral, o argumento de autoridade pode enganar o leitor, reforçar vieses cognitivos ou fazer o autor da redação passar papel de bobo.
Observe o exemplo da redação avaliada com nota mil no ENEM 2021 de Gabriel Borges:
“Primeiramente, vê-se que o apagamento social gerado pela falta de registro civil apresenta suas origens no passado. Para o sociólogo Karl Marx, as desigualdades são geradas por condições econômicas anteriores ao nascimento de cada ser, de forma que, infelizmente, nem todos recebem as mesmas oportunidades financeiras e sociais ao longo da vida. Sob esse viés, o materialismo histórico de Marx é válido para analisar o drama dos que vivem sem certificado de nascimento no Brasil, pois é provável que eles pertençam a linhagens familiares que também não tiveram acesso ao registro. Assim, a desigualdade social continua sendo perpetuada, afetando grupos que já foram profundamente atingidos pelas raízes coloniais e patriarcais da nação. Dessa forma, é essencial que o governo quebre esse ciclo que exclui, sobretudo, pobres, mulheres, indígenas e pretos.”
Conclusão
A última parte de um texto dissertativo-argumentativo deve resumir brevemente a problemática trabalhada nos parágrafos anteriores, por isso, alguns especialistas chamam a conclusão de “nova tese”.
Ela é o acabamento das ideias e a inserção de uma nova. A conclusão apresenta as consequências da argumentação, é o momento de propor soluções. Não deve ser longa, costuma ter o mesmo tamanho da introdução. A proposta de intervenção deve fazer sentido com o resto do texto, para garantir isso, a dica é se preocupar com coesão, coerência e a consistência dos argumentos. Em qualquer correção esses quesitos valem pontos.
Assim como nas demais partes do texto, existem diversos tipos de conclusões:
Síntese;
Como o próprio nome diz essa forma de conclusão sintetiza os aspectos abordados no desenvolvimento do texto, não por inteiro, pois isso tornaria o texto repetitivo, mas de forma sintética. Evite a repetição de palavras e frases. É comum encontrar parágrafos de conclusão começando com um elemento coesivo, ou seja, conectivos, tais como assim, portanto, desse modo, diante disso, nesse sentido e etc.
Temos como exemplo o texto de José Aristodemo Pinotti, intitulado Anencefalia, para o jornal Folha de São Paulo:
“Entendo essa discussão [a de aborto de anencéfalos] como dolorosa, porém necessária. Com o avanço acelerado da ciência e da tecnologia, temos de refletir continuamente sobre inúmeros assuntos desse tipo, estabelecendo, com reflexão profunda, balizamentos éticos, morais e legais para cada um deles. Quanto aos argumentos religiosos, que são tão importantes e respeitáveis quanto os anteriores, dizem respeito à consciência e decisão de cada um. Por isso é importante dar às mulheres e seus companheiros o direito de optar de modo informado.”
Agregação;
Na agregação finalizamos o texto com uma palavra ou frase que tenha um valor mais abrangente, ou seja, apresentamos uma ideia capaz de reunir todos os aspectos abordados anteriormente.
No exemplo a seguir veremos que o autor de uma redação para o vestibular da Fuvest em 2004 tratou separadamente de duas concepções, negou as duas e então defendeu uma terceira.
“As concepções de tempo foram construídas pela mente humana; logo, não há nenhuma que sirva como verdade universal. Por isso não se pode impor uma a toda a sociedade, evitando, assim, a degradação do pensamento do indivíduo em favor do pensamento de massa que teria um resultado negativo para a evolução da humanidade.”
Proposta;
Aqui concluímos com propostas ou sugestões para a problemática trabalhada. O ideal é que sejam o mais concretas possível, evite sugestões vagas, como “é preciso que tomem consciência” ou “somente quando cada um de nós fizer sua parte”. Sugestões concretas tornam o texto mais persuasivo como um todo.
Mais uma vez a redação de Gabriel Borges para o ENEM de 2021 nos fornece um exemplo:
“Portanto, o registro civil deve ser incentivado de maneira mais efetiva no país. O Estado criará um mutirão nacional intitulado “Meu Registro, Minha Identidade”. Esse projeto funcionará por meio da união entre movimentos sociais, comunidades locais e órgãos governamentais municipais, estaduais e federais, visto que é necessária uma ação coletiva visando a consolidação da cidadania brasileira. Com o trabalho desses agentes, serão enviados profissionais a todas as cidades em busca de pessoas que, finalmente, terão suas certidões de nascimento confeccionadas, além de receberem acompanhamento e incentivo para a realização de cadastro em outros serviços importantes do sistema nacional. Por conseguinte, o Brasil estará agindo ativamente para reparar suas injustiças históricas e para solidificar sua democracia, de maneira que os seus cidadãos sejam vistos igualmente.”
Pergunta;
Nesse modelo de conclusão a pergunta é puramente retórica, pois a resposta direta ou indiretamente, já foi apresentada ao longo do texto. Tem a função de reforçar o ponto de vista do autor e estimular o leitor a se questionar. Seu uso é incomum, principalmente em grandes avaliações.
No texto “Focas sim, crianças não” de Amaury Castanho para o jornal Folha de São Paulo, na introdução e ao longo do desenvolvimento, Amaury já havia se posicionado contra a iniciativa do governo de pôr em discussão a legislação vigente sobre o aborto, antes de concluir dessa forma:
“Para que a discussão [sobre aborto] na sociedade, se de antemão e publicamente, a ilustríssima ministra Nilcéa já se disse favorável a novos casos de despenalização do aborto voluntário? Somos um povo sábio e esclarecido ou ‘neobobos’ e imbecis?”
Surpresa;
Na conclusão-surpresa, além das citações de escritores, filósofos, estadistas, compositores, entre outros, pode haver também uma pequena história, uma piada, um pensamento que ilustre tudo o que se desenvolveu ou atribua novos sentidos ao texto. São poucos os autores que se arriscam nesse modelo, sobretudo aqueles que não tem muita familiaridade com o gênero textual e em grandes avaliações.
No exemplo a seguir, Agnelo de Carvalho Pacheco usa duas surpresas em seu texto para a revista São Paulo: Texto e Ofício. A primeira uma referência irônica ao então presidente Fernando Collor de Mello (“coloridas”) e depois uma citação de Olavo Bilac.
“‘É necessário enxergarmos a realidade com lentes menos “colloridas”, o que significa reinterpretar os versos de Bilac: ‘Crianças! Não verás nenhum país como este’ (enquanto sobreviveres a miséria).
Revisão
Essa etapa é essencial, é a leitura final na qual serão feitas os últimos ajustes. Se possível, nunca entregue um texto sem revisão. Releia a proposta e confira se tudo o que foi pedido consta na sua redação. Se atente para a gramática, ortografia, pontuação, a divisão de parágrafos, concordância ou qualquer deslize devido a falta de atenção. Se o texto for digitado confira a formatação, incluindo tamanho de letra e margens. Para textos manuscritos, observe sua caligrafia, utilize uma letra legível e evite marcas de borracha e borrões no papel.
Para casos com prazo confortável, a melhor estratégia de revisão é deixar o texto descansar, pelo menos um dia. Descanse o cérebro e terá um olhar renovado. Se possível, peça uma segunda opinião, um amigo, responsável ou professor.
Dicas extras:
Evite generalizações: Mais do que evitar, elimine completamente. Generalizações revelam falta de reflexão sobre o assunto.
Evite o uso da voz passiva: Uma das três vozes verbais, juntamente com a voz ativa e a voz reflexiva, a voz passiva é uma construção gramatical em que o sujeito da oração recebe a ação expressa pelo verbo. Por exemplo: “A carta foi escrita por João”. Na voz ativa, a melhor opção para a maioria dos textos, essa frase ficaria “João escreveu a carta”. A voz passiva pode soar ambígua e a redação deve ser clara e direta.
Evite o hipérbato: É uma figura de linguagem que define a inversão da estrutura dos elementos da frase, por exemplo: “dorme tranquila a menina, "triste estava Manuela”. Pode prejudicar a clareza da mensagem.
Não seja redundante: Cuidado para não repetir a mesma informação ou argumento ao longo do texto, ainda que através de diferentes palavras e expressões.
Evite hipérboles: Em outras palavras, não exagere, evite frases no superlativo.
Não abuse das exclamações: Se for usar exclamações e interrogações, use com cautela e jamais faça como faria nas redes sociais. Apenas uma por frase e só.
Não exagere nas citações: Citações são ótimas, mas não construa um texto apenas disso, quem cita demais geralmente não tem ideias próprias para mostrar aos corretores.
Evite frases longas: As frases longas geralmente são resultado de má pontuação. O leitor pode perder-se nas informações, opte por frases curtas e períodos bem pontuados.
Evite mesóclises: é a colocação do pronome no meio do verbo, por exemplo: Desenhar-te-ei. Como praticamente não é utilizada hoje em dia, o risco de você não saber usá-la de forma correta é muito grande, não corra um risco desnecessário de perder pontos.
Evite regionalismos linguísticos: O corretor da redação pode não reconhecer a expressão.
Evite chavões e lugares-comuns: Pode ser considerado vício de linguagem e preguiça linguística.
Pratique sua redação: Só se alcança a excelência em produção textual com muita prática, tente escrever pelo menos uma vez por semana, no mínimo.
*
Se você chegou até aqui na leitura, parabéns pela dedicação. Não se preocupe, já tem o que é preciso para uma boa redação. Lembre-se de que os corretores não estão buscando um bicho de sete cabeças, não precisa ser extraordinário. Você só precisa organizar suas ideias de forma concisa e expressá-las de forma adequada.
Espero que esse texto tenha sido útil, boa prática!
Fontes: Texto & Interação (2009), Atual Editora
CEREJA W.; MAGALHÃES T. Português Linguagens 1. São Paulo: Atual, 2008.
ABAURRE M.L.; ABAURRE M.B.; PONTARA M. Português: contexto, interlocução e sentido. São Paulo: Moderna, 2008.
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